DIREITO AO SILÊNCIO PARCIAL - Existe no Brasil? (explicação completa)
julho 26, 2022O direito ao silêncio é consagrado na Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LXIII, tendo vínculo direto com o princípio da não autoincriminação, ou seja, ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo (nemo tenetur se detegere). O interrogatório do acusado (em fase administrativa ou não), é o momento em que ele pode utilizar desse direito e tal ato tem natureza jurídica como ato de defesa, especificadamente como o exercício direto da autodefesa. E para que esse interrogatório seja realizado dentro dos padrões legais o acusado deve ser advertido da possibilidade de permanecer em silêncio, além, é claro, de seu direito de ser assistido por advogado, mas, afinal, ele pode responder apenas as perguntas do seu advogado(a)?
Lembram-se do famoso aviso que vemos em séries de TV que os policiais americanos fazem as pessoas que estão sendo presas? Eles dizem: “Você tem o direito de permanecer calado e tudo o que disser poderá ser utilizado contra você no tribunal”. Pois então, aquilo é chamado de Miranda Rights ou, de forma traduzida, Aviso de Miranda (clique aqui para ler sobre). Ele começou a ser utilizado após o julgamento do caso Miranda versus Arizona (1966), eis que Ernesto Miranda teve sua condenação anulada por ter sido interrogado por duas horas sem que se tivesse feito o aviso de seu direito constitucional ao silêncio. No início, esse julgado não estava sendo devidamente cumprido pelas forças policiais, entretanto, quando as condenações foram sendo anuladas em razão de sua ausência, a prática se tornou regra nas instituições.
Isso significa dizer que o direito ao silêncio encontra total relevância e proteção em estados democráticos. Assim, especialmente em fase judicial, iniciou-se o debate de a possibilidade de o acusado responder somente as perguntas de sua defesa. Pense comigo, se ele poderia silenciar sobre tudo, tendo o interrogatório natureza jurídica de meio de defesa, porque não poderia silenciar parcialmente? Seria como aplicar um bordão conhecido, pelo simples raciocínio lógico: quem pode mais, pode menos. Mas, nem todos os julgadores pensam assim.
Diversos juízos de 1º Grau quando confrontados com o pedido do acusado de responder somente as perguntas de sua defesa apresentam contrariedade e não abrem a palavra para a Defesa, afirmando que ou o acusado responde a todos ou a ninguém, se tendo notícia e muitos que encerram o ato e prosseguem com as diligências finais e encerramento da instrução processual.
Por essa razão, esse debate chegou até as Cortes Superiores, e tomou especial notoriedade através do Habeas Corpus 688.748 do Superior Tribunal de Justiça, quando o Ministro Joel Ilan Paciornik, determinou que fosse refeito o interrogatório do réu, podendo este exercer o silêncio seletivo, apontando e sua decisão que outros casos semelhantes já haviam sido julgados pela corte no mesmo sentido pelo Ministro Fux e pelo Desembargador convocado Jesuíno Rissato.
No Superior Tribunal de Justiça, em 05 de abril de 2022, por meio do Habeas Corpus n.º 703.978, sobreveio decisão colegiada sobre o tema, tendo como relator o Ministro Olindo Menezes, sedimentando o posicionamento favorável ao réu, apontando que este poderia responder somente sua defesa, perguntas específicas de cada um dos questionadores entre outros métodos, utilizando-se do que melhor for estrategicamente para sua defesa, sempre considerando a natureza jurídica como meio de defesa.
Além das questões lógicas que englobam o direito ao silêncio, necessário também analisar a redação do artigo 186 do Código de Processo Penal, eis que este sustenta que: “[...] o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas”, ao dizer, na letra fria da lei, que este pode selecionar as perguntas que deseja responder dá ao acusado o direito ao silêncio parcial taxativamente.
Portanto o acusado tem o direito de responder somente as perguntas de sua defesa, se essa for a melhor estratégia para o caso. Importante lembrar que todo caso deve ser analisado individualmente para saber qual a melhor atitude para o interrogatório do acusado.
Por: Milena Santos
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