O AVISO DE MIRANDA EXISTE NO BRASIL?

junho 30, 2022

 

“Você tem o direito de permanecer calado e tudo o que disser poderá ser utilizado contra você no tribunal.” 

O famoso aviso que vemos nas séries policiais americanas, atualmente, é comum, e se originou em 1966, através do famoso caso Arizona vs. Miranda, pois Ernesto Miranda foi submetido a um interrogatório de duas horas, assinando uma confissão, sem que tenha sido informado de seu direito constitucional ao silêncio e de possuir um defensor particular ou público, o que seria violação da Quinta Emenda da Constituição Americana.  

Digno apontar que os tribunais são impedidos de incluir nos processos declarações autoincriminatórias prestadas sem alerta ao direito ao silêncio. Essa situação, notadamente, é cultural no Estados Unidos, e diga-se, na maioria dos países de primeiro mundo na Europa, mas e no Brasil? 

Miranda obteve êxito em anular sua confissão, assim como estabeleceu o precedente necessário para determinar a obrigatoriedade da realização da informação ao acusado de seu direito de permanecer em silêncio, estabelecendo-se assim o Miranda Rigths. Grisham, em sua obra O Homem Inocente (veja aqui), alerta que de plano as forças policiais ignoraram a decisão da Suprema Corte Americana e somente passaram a aplicar essa determinação por que as condenações provenientes de confissões sem informação ao direito ao silêncio passaram a ser anuladas, assim como excluída dos procedimentos ainda em julgamento. 

No Brasil, a jurisprudência, vem discordando da necessidade ou não da realização do aviso, com uma leve tendência pela desnecessidade de realização do aviso, convalidando eventuais confissões informais dos acusados de delitos, razão pela qual foi determinada a repercussão geral no RE 1.177.984, tombada sob Tema 1.185, em votação unânime, sendo assim determinada sua redação: “Obrigatoriedade de informação do direito ao silêncio ao preso, no momento da abordagem policial, sob pena de ilicitude da prova, tendo em vista os princípios da não auto-incriminação e do devido processo legal.” 

Repercussão geral em um caso significa que seu tema é relevante para o campo jurídico-social e extrapola os limites subjetivos da causa, isso quer dizer que é importante para toda comunidade jurídica que tal tema seja analisado e seus efeitos trarão consequências a todos que atuam no ramo. 

Os posicionamentos quanto à desnecessidade podem ser observados nos julgamentos do AgRg no HC 674.893/SP, de relatoria do Ministro João Otávio de Noronha, componente da Quinta Turma do STJ, HC n. 742.003/SP e (AgRg no HC n. 697.827/SC, ambos de relatoria do Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do Tjdft), Quinta Turma do STJ entre outros julgados. 

Ainda, as Cortes Superiores, em grande maioria, entendem que a confissão informal proveniente do momento da prisão somente gera nulidade relativa, devendo haver prova do prejuízo, entretanto a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, apresentou posicionamento a fim de decretar a nulidade da confissão e seu desentranhamento dos autos pela ausência do aviso de Miranda. 

Assim, a posição contrária ao firmamento do Aviso de Miranda como obrigatório não é unânime. 

O 5º, inciso LXIII da Constituição Federal, que assim determina: “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”, ou seja, através de sua mera leitura observa-se a necessidade de aviso imediato do preso e custodiado da autoridade policial quanto ao direito ao silêncio e de postular defensor. 

Ao não delimitar o aviso à pessoa interrogada formalmente, utilizando-se a expressão preso, a análise constitucional apresenta literalidade da necessidade desse aviso no ato da prisão, especialmente no Brasil, onde iniciar o interrogatório informar no momento da prisão em flagrante ou no cumprimento de mandado de busca e apreensão é normal. 

Esse entendimento vem sido defendido perante o Supremo Tribunal Federal por Alberto Zacharias Toron e Renato Marques Martins, autores do Recurso Extraordinário que teve repercussão geral reconhecida.

Portanto, o que se espera é que a Suprema Corte realize a leitura pela ótica constitucional, declarando a necessidade de implantação imediata do Aviso de Miranda nas atuações policiais, rechaçando qualquer ato autoritário contrário aos direitos constitucionais, especialmente pelo direito ao silêncio ter proteção especial da Corte, pela sua importância na ordem jurídica constitucional. 

 Por: Milena Santos

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